Dia 30 de outubro de 2022, completam-se 23 anos do assassinato da mulher, exemplo da luta pela terra e na política brasileira, Dorcelina Folador.


A Sem Terra e prefeita pelo Partido dos Trabalhadores (PT) de Mundo Novo , no Mato Grosso do Sul, na época com 36 anos, foi assassinada com seis tiros pelas costas no dia 30 de outubro de 1999, na varanda de sua casa.


Segundo informações de veículos de imprensa da região, o assassinato de Dorcelina foi encomendado pelo Secretário da Fazenda do município de Mundo Novo, Jusmar Martins da Silva. Ele foi acusado de contratar o pistoleiro, Getúlio Machado, que confessou o crime e disse que receberia R$ 35 mil pelo assassinato da prefeita.


Dorcelina nasceu no dia 27 de julho de 1963, em Guaporema, no Paraná. Chegou a Mundo Novo em 1976, onde iniciou sua atuação na Pastoral da Juventude (PJ) e nas Comunidades Eclesiais de Base, em 1980. Em 1987, ajudou a fundar o PT, candidatou-se  vereadora. Depois foi eleita de prefeita de Mundo Novo. Ela também ajudou a fundar a Associação Mundonovense dos Portadores de Deficiência Física (AMPDF).


Ela foi professora, poeta, artista plástica e em 1989 se engajou na luta pela terra no Estado do Mato Grosso do Sul, militando no MST e fazendo parte da direção estadual desse movimento.


Segundo a irmã da ex-prefeita, Marlene de Oliveira, “a Dorcelina morreu lutando. Lutando com dignidade para que outro mundo fosse possível”, resume. Em 2013, ao prestar sua homenagem à Dorcelina o ex-presidente Luiz Inácio Lula afirmou que ela deixou um importante legado na luta das mulheres, em defesa das reivindicações de gênero e como prefeita de Mundo Novo.


O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conheceu Dorcelina como militante do PT e liderança do MST. “Foi uma companheira de um valor político extraordinário, de uma garra excepcional. Uma daquelas mulheres que brigava 24 horas por dia pelo que acreditava. E foi exatamente por ser assim, por ter esse comportamento desafiador, que ela foi assassinada dentro da sua casa”, denunciou o ex-presidente.


Para Lula, ela foi uma ótima prefeita e boa gestora, que em nenhum momento deixou de lado a militância no movimento social. “Gostaria que o PT tivesse mais gente com o caráter e com a garra da Dorcelina Folador. Mais do que uma prefeita, ela era uma guerreira em defesa das causas do povo oprimido desse país. Uma referência de mulher, de política e de militante”, completa.


O dirigente nacional do MST no Mato Groso do Sul e um dos fundadores da Via Campesina, Egídio Brunetto, falecido em 2011, após seu assassinato contou que, a Dorcelina era conhecida pela ‘limpeza’ que fez na administração do município e por romper com grupos criminosos ligados ao poder público, na região. “Ela fez uma administração voltada ao interesse público e mexeu com a máfia da fronteira”, contou Brunetto.


Dorcelina Folador também contribuiu com a comunicação popular, atuando como repórter popular no Jornal Sem Terra (JST) do MST por cinco anos. Sendo admirada pela disposição, apesar da deficiência física na perna esquerda. Em uma das matérias, publicada no JST em março de 1990, Dorcelina denuncia o descaso com um grupo de famílias de trabalhadores Sem Terra, que sofriam com despejos no município de Anastácio, MS. Diante da situação precária das famílias, ela anuncia que a única saída é “ocupar”, pois acreditava ser a Reforma Agrária “uma bandeira de toda a classe trabalhadora”.


Dorcelina foi uma mulher Sem Terra, seu nome está em escolas, acampamentos e cirandas para que não nos esqueçamos de sua luta por uma sociedade justa e igualitária. Seu exemplo segue sendo símbolo de nossa resistência na luta contra a opressão.  Dorcelina irradiava coragem e esperança. Eleita prefeita numa vitória popular que enfrentou as ameaças do latifúndio e do narcotráfico, mereceu mais de 80% de aprovação popular. Tem sido definida como eficientíssima “deficiente (pela poliomielite), mãe militante da vida e da ética, alegre e intensa, autodidata, artista plástica, educadora, verdadeira, solidária, cristã”. Recebeu o prêmio Marçal de Souza de 1999. O Evangelho de Jesus Cristo esteve sempre presente em sua vida.  A Bíblia ficava sempre aberta, em sua sala da prefeitura, precisamente no Salmo 27: “Javé é minha luz e salvação; de quem terei medo?”






"Quisera intitular este poema


Com dosséis de flores, bem suficientes, 


Todas nuas e inconformadas pelo vento. 


Quisera a suavidade e as penumbras


Que chegam sempre do leste, em movimento. 


Uma menina no balanço, uma taça


De água limpa colhida ali no monte.


Uns longos dedos cultuando o corpo


Em hipérbole, até nascer semente.


Um culto à sombra que afugenta


O estágio último da lua, arqueada no infinito.


Quisera um orvalho sobre as letras, 


Pronto para escorrer no perfume esmaltado na manhã. 


Um fio alongado sobre o nada, sempre mais, 


Até romper a etérea finitude dos corpos. 


Uma ave suspensa numa vírgula, essa que Deus 


Inventou para um suspiro diminuído 


Antes da palavra final.


Quisera estas coisas pendulares que te cercaram. 


Que te deixaram lágrima. Que te fizeram sombra. 


Que te visitaram no meio da escuridão 


Quando tudo era suspeito, contraído, sóbrio como o medo. 


Que te mostraram o vazio. Que te assanharam os pêlos.


Que não te desviaram o rumo.


Quisera teu vigor. Teus motivos e alegorias. 


Quisera o que ninguém soube. O que não contaste. 


Porque foi isto somente — as insignificâncias, 


Que te fizeram mulher, mais Dorcelina,


Por dentro e por fora, o nome do meu poema!


                                   -Dorcelina Folador-




Por: Jonny Dutra