Os donos da Fazenda Annalu, em Deodápolis (MS), usada como cenário da novela “Terra e Paixão”, da TV Globo, cometeram alguns crimes ambientais, como desviar o curso do rio e criar peixes sem licenciamento ambiental. A denúncia é do site “De Olho nos Ruralistas”. A novela global termina nesta semana e é considerada o maior sucesso desde Pantanal em 2022.
Ambientada no município fictício de Nova Primavera, no Mato Grosso do Sul, a trama de Walcyr Carrasco narra a epopeia do clã La Selva, liderado pelo impiedoso latifundiário Antônio (Tony Ramos), cujo filho Caio (Cauã Raymond) se apaixona por sua rival, a professora Aline (Bárbara Reis).
“As informações são oriundas do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) elaborado em março de 2022 pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MPMS) e firmado pelo empresário Lelinho Rocha. No TAC, é listada uma série de irregularidades ambientais na área da fazenda, reveladas por este observatório na reportagem: ‘Fazenda de ‘Terra e Paixão’ tem desmatamento de reserva e despejo ilegal de agrotóxicos’”, apontam.
Confira mais trecho da reportagem:
“Tanques operavam sem licenciamento ambiental
Em junho de 2019, quando foi realizado o primeiro laudo de vistoria técnica do Ministério Público, o licenciamento para a atividade de piscicultura estava vencido havia nove anos, desde janeiro de 2010. Durante esse período, o imóvel passou por várias mãos.
Adquirida em 2003 por Nilton Rocha Filho, avô dos atuais proprietários, a Fazenda Annalu foi vendida dois anos depois para a comercializadora de grãos Granol, pelo valor de R$ 2,95 milhões de reais. Em 2016, os netos do antigo proprietário, Aurélio Rolim Rocha — conhecido como Nelinho — e Nilton Fernando Rocha Filho, readquiriram a propriedade por R$ 10 milhões. Apenas em 2021, após três anos operando sem licenciamento, Nelinho regularizou os tanques para a criação de peixes.
Apesar da alteração do curso do rio que passa pela propriedade, os danos causados pelos 37 tanques escavados na margem direita do Rio Dourados não são citados em nenhum dos relatórios de vistoria juntados às investigações dos possíveis danos ambientais na Fazenda Annalu.
O TAC destaca ainda a existência de 54 drenos, com extensões que variam entre 10 e 3.761 metros. Todos eles sem licenciamento. Essas estruturas são utilizadas tanto para a drenagem de terrenos alagados quanto para a captação de recursos hídricos destinados à irrigação, pecuária e piscicultura.
De acordo com um morador da região, que preferiu não se identificar, a construção dos drenos — que ele chama de diques — “fez um estrago danado” nas margens do rio. “Eu sei que fizeram um dique pra levar água pra irrigar os pivôs, um dique de uns de quatros metros de largura por cinco de profundidade”, conta.
Justificativa para abertura de drenos é desmentida pela própria empresa
Parte dos drenos identificados pelo laudo técnico do MPMS invade a Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Dourados. Segundo o relatório anexado ao TAC, a instalação de drenos é comum na região, sendo uma medida necessária para a agricultura em áreas frequentemente inundáveis e com presença de lençol freático superficial — o que, segundo o laudo de vistoria, é o caso da Fazenda Annalu.]
Apesar da justificativa, a disposição das estruturas na propriedade demonstra que os drenos possuem utilidade diversa, uma vez que se estendem muito além da área inundável do solo.
Outra contradição relacionada à drenagem na propriedade vem de um documento formulado pelos proprietários da Annalu. Um laudo produzido em 2018 por uma empresa contratada pelos fazendeiros para tentar comprovar a existência de Reserva Legal na fazenda, a LG Consultoria Ambiental, foi taxativo em afirmar que “não há excesso de água em qualquer época do ano, em função da boa permeabilidade, porosidade e lençol freático muito profundo”.
Por meio de imagens de satélite de 2009, o MPMS pôde constatar que a instalação dos drenos na propriedade é anterior a julho de 2008. Segundo o laudo de vistoria, a abertura de drenos no local altera as condições naturais de saturação e encharcamento do solo.
Para quem mora na região, o impacto é visível. “Tinha uns varjão lá que diz que nem sucuri passava, mas abriram tudo”, lamenta um morador. Uma realidade ignorada pelas imagens idílicas de monocultura e maquinários agrícolas disseminada na novela “Terra e Paixão”.”
*O Jacaré